Os Fioretti de Padre Carlos Henrique

Os Fioretti (que significa “As florzinhas”) de São Francisco, são um conjunto de pequenos relatos sobra a vida do santo, de Santa Clara e dos primeiros frades. Transmitidos inicialmente de maneira oral, foram compilados, muitos anos após. As histórias contadas nos Fioretti de São Francisco, às vezes, são engraçadas, como as histórias de Frei Junípero porém, sempre nos ajudam na reflexão sobre o sentido da vida, sobre o ser efêmero da natureza humana, sobre a humildade enfim, as histórias narradas levam sempre à Glória de Deus e ao rebaixamento da soberba humana.

Eu me lembrei dos Fioretti de São Francisco, que li, não riem de mim, no ano de 1983. Já se vão 32 anos. Mas a obra se torna tão atraente e significante que, depois desses anos todos, ainda me lembro de muitas das suas histórias. Uma delas que até gosto de cantar, porque aprendi a música, também, em 1983, é “A Perfeita Alegria”.

Então… Até agora foi só a introdução para lhes contar o que me aconteceu ontem. A experiência, como muitas outras em minha vida, talvez possa ser considerada como os contos engraçados, porém, de grande ensinamento, como os do santo e de seus companheiros, narrados naquela obra que li em 1983.

Ontem, dia 08 de dezembro, dia da Imaculada Concepção de Maria, festa da exaltação na mãe, enquanto se espera a chegada do Filho, levantei cedo e, antes de ir para a biblioteca da Universidade onde estudo (ontem funcionou) eu fui à missa na Igreja dedicada à Maria. A missa foi em catalão. Eu já escrevi sobre essa missa uma vez. O som do órgão de tubo invade o recinto e eleva qualquer coração que esteja ali. Não importa de quem seja. Nem que seja o meu. Sinto-me invadido com tão solene sonoridade. A missa, também, é muito bonita, quando celebrada por um padre mais velho. Os padres mais novos, são mais frios na celebração. Mas o mistério celebrado é o mesmo e, por isso, não me importo. Em todo caso, depois da missa, segui para o meu destino e por lá fiquei até as 18 horas. O meu estudo rendeu muito ontem. E, eu, estava muito inspirado. Talvez pelo dia de Maria ou mesmo, pelo tempo do advento, que sempre nos inspira.

À noite, já em casa, lembrei-me de comprar pão. Comeria um pedaço no lanche da noite e deixaria o outro para comer hoje cedo, com o café da manhã. Eu vesti minhas blusas, muito embora não esteja tão frio, mas sempre gosto de me agasalhar. Eu visto sempre duas blusas. Fui para a padaria. Comprei o pão e o coloquei numa sacola de plástico que eu tinha levado.

Perto de onde eu moro, tem uma capela. É a Capela do Sagrado Coração de Jesus, das Irmãs, cuja congregação se chama: Escravas do Coração de Jesus. Passando pela porta, vindo da padaria, com o pão na sacola de plástico, resolvi entrar e fazer a Oração da Noite, do aplicativo “Católico Orante” que tenho no celular. Ao entrar, vi que o Santíssimo Sacramento estava exposto e que, algumas irmãs estavam, bem mais à frente, em adoração. Tranquilamente me acomodei e peguei o celular e comecei a rezar a referida oração. Eu não tinha visto que atrás da porta da entrada tinha uma freira sentada. Passei por ela e não a vi. Tudo bem.

Logo em seguida, entrou outra freira, um pouco mais idosa que a que estava sentada atrás da porta. Aliás, todas as freiras que tenho visto naquela capela, são mais idosas. A freira entrou por outra porta diferente da que eu havia entrado. E, logo que me viu, veio como quem não queria nada. Passou por mim e me olhou bem. Viu o pão na sacola. Eu balancei minha cabeça para ela. Somente.

Eu escutei quando ela se dirigiu à outra freira que estava sentada atrás da porta perguntando: “Quem será esse que ali está?” A outra respondeu: “Não sei. Ele está ai há algum tempo”. A freirinha tornou a perguntar: “Você não o conhece? Já o viu por aqui?” A outra freira respondeu: “Não”. A freirinha, bem espertinha, perguntou com voz trêmula: “Não será um bandido?” A outra respondeu: “Acho que não”. Curiosamente a freirinha voltou para o meu lado, devagarinho. “Hola!” Disse ela. Eu, Hola Irmã! Ela me disse: “Que haces aqui?” Eu respondi: Vim rezar. Ela perguntou: “Tu vives donde?” Eu respondi: “Vivo cerca de aqui” (vivo perto daqui). Ela me perguntou: “Como te llamas?” Eu respondi: Carlos. Ela me disse: “Mi padre también se llamava Ricardo. Nombre belíssimo.” Eu ri e ela riu. Disse que rezaria por mim, porque tem muito bandido no mundo. Rezaria para Deus me livrar de todos.

Depois da abordagem da irmãzinha, acabei minha oração da noite, rezando a “Salve Regina” (que também aprendi no seminário dos franciscanos, em 1982) e fui conversar com a outra que, conservava-se atrás da porta. Apresentei-me e disse que era “cura”. Falei que morava no prédio ao lado e que estava em Barcelona a estudos. Ela ficou muito feliz e me pediu uma bênção, “em português” – disse ela. Dei-lhe a bênção de São Francisco. A mesma do livro dos Números. Voltei para casa, com o pão que havia comprado, na sacola.

Ao me deitar fiquei pensando no acontecido e achei bom. Nada de honras, nada de glórias. A minha casula está guardada lá no Brasil. E eu nem tenho autorização da Arquidiocese de Belo Horizonte para celebrar aqui. Mas a celebração aconteceu, ou seja, o dia foi bem celebrado e coroado com a dúvida daquela irmãzinha. Eu rezei a Deus, agradecendo por tê-la inspirado de, ao menos, pensar que eu fosse “bandido”.  Rezei por ela e por todas as outras. Rezei pelo pai dela, Sr. Ricardo, que já deve ter ido desta para melhor. Com Deus me deito, com Deus me levanto, com a graça de Deus e do Divino Espírito Santo. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém. E dormi.

Leave a Reply