Lá em casa foi assim

Lá em casa foi assim…

 

Padre Carlos Henrique Corrêa Senna

 

Quando chega o tempo do Natal eu sempre me lembro do meu pai, por ocasião do nascimento do meu irmão. Nossa casa, como a maioria das casas naquele tempo, era pintada de cinza claro do lado de fora e branco gelo do lado de dentro. Cinza e gelo sempre me inspiravam introspecção e tristeza. Também os túmulos no cemitério da minha cidade eram pintados da mesma cor.

Mas aconteceu algo novo na nossa casa. Quando meu irmão caçula nasceu meu pai pintou a sala da nossa casa de verde. Um verde que nos remetia para além da parede. Um verde que refletia algo novo. A esperança foi resgatada. Meu pai, com certeza, racionalmente, não sabia o que estava acontecendo, mas a verdade é que ele proclamava naquela sala verde a sua fé no novo tempo. Os outros cômodos da casa foram pintados de branco. Foi colocado sinteco nos tacos. E, para nossa surpresa, papai comprou uma televisão. Foi a primeira lá em casa.

Meu irmão nasceu quando minha irmã mais nova tinha oito anos. A nossa vida se renovou. A esperança renasceu nos nossos corações e a vida pode ser retratada, nas paredes e no piso de nossa casa. A alegria de todos com a chegada daquela criaturinha aproximou-nos muito mais e nos acalentou em nossa luta, que não era fácil naquele tempo.

Penso que na família dos filhos de Deus foi mais ou menos assim. Chegada a plenitude dos tempos, um irmão querido se fez carne em nossa carne. Veio pintar de verde o coração de cada criatura, como a sala lá de casa. Sala e coração – lugares da acolhida. Deus fez brotar a esperança e a alegria de todos os seus filhos, proporcionando-lhes contemplar, no pequenino da gruta, a grandeza de seu amor.

Todos os nossos vizinhos se alegraram com a chegada de meu irmãozinho. Muitos vieram, até mesmo de longe, trouxeram seus presentes, como os reis magos de outrora,  rezaram com minha mãe e se encantaram com a presença daquela luz em meio às cinzas que ainda restavam em nossa casa. Aos poucos as trevas deram lugar à luz e todos ficamos repletos da luminosidade vinda do coraçãozinho daquela criatura.

E o menino cresceu em estatura e graça, diante de Deus e diante dos homens.

É bom celebrar o Natal. É bom parar e re-tratar a vida. É bom mergulhar no mistério de Deus, que não está tão longe. Está no meio de nós. É Deus conosco. Continua nascendo, como nasceu lá em casa. Como nasce a cada instante no coração de todos nós. E ele não se cansa, apesar de tantas contradições nossas. Deus continua com seu pincel, pintando de verde, como meu pai lá em casa, o coração de todos nós – a verdadeira sala onde Ele quer sempre estar. Feliz Natal!

20/12/2010.

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